O Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB contempla vários projetos que alteram o plano original da cidade no que diz respeito à destinação de espaço público na área da construção civil. Dentre eles um dos que causa maior indignação e polêmica é a construção de uma edificação de quatro andares subterrâneos no canteiro central da Esplanada dos Ministérios, de 340 mil metros quadrados para abrigar um estacionamento que comportará 10 mil carros e também, um grande shopping center com agências bancárias, restaurantes, lanchonetes, lojas e outros prestadores de serviços , a um custo estimado de R$ 800 milhões.
Muitas críticas fundamentam-se na maneira e forma assoberbada, intempestiva, pouco analisada e discutida que justifica tal proposta. O próprio Detran-DF, órgão ordenador do trânsito na capital do país, afirmou que “Estes projetos tendem a incentivar o uso de veículo motorizado individual, o que é contrário à Política Nacional de Mobilidade Urbana estabelecida”, ou seja, não garantindo melhoria no trânsito da cidade.
No dia 25/03/2014 o PPCUB começou a ser votado pelo Conselho de Planejamento Territorial e Urbano, que é constituído por 26 membros, sendo 13 representantes do governo e 13 representantes da sociedade civil. Dentre esses, representantes do Instituto de Arquitetura de Brasília, da Rodas da Paz e professores e urbanistas da Universidade de Brasília. Finalizada a votação, o mesmo foi aprovado, tendo sido interrompido pelo Ministério Público o prosseguimento do processo com questionamentos sobre a composição do Conselho.
A construção desse estacionamento subterrâneo só vem consolidar a opção que os governantes da capital do país vêm fazendo, ao longo dos seus anos, pelo transporte individual, principalmente pelos automóveis e motocicletas, sem levar em conta todos os resultados profundamente negativos que geram: poluição ambiental e sonora; aquecimento global; incapacidade absoluta que a cidade tem de absorver e abrigar a quantidade exagerada de veículos que dia a dia são colocados em trânsito, promovendo longos congestionamentos; aumento no tempo médio de deslocamento entre o ponto de partida e o destino das pessoas; aumento de mortes, acidentes e pessoas com sequelas; aumento do nível de stress e , por consequência, comprometimento da qualidade de vida; não atendimento do interesse coletivo o que torna a opção elitista e discriminatória.
Cabe ressaltar que a prevalência do transporte individual coloca o Brasil, e especialmente Brasília, na contramão dos países desenvolvidos que vêm priorizando o transporte coletivo de qualidade e nos dando exemplos significativamente positivos sobre a mobilidade urbana.
O que causa mais estranheza é que Brasília, sendo uma cidade que foi pensada para preservar espaços vazios; que possui uma configuração geográfica limpa, longilínea com predominância de linhas retas, vias alternativas que seguem harmoniosas sem se deparar com obstáculos naturais ou construídos pelo homem; que possui horizonte aberto e iluminado; que é livre, moderna avançada e inovadora não tenha, até hoje, sido objeto de políticas públicas efetivas que priorizem os pedestes, as bicicletas e o transporte público de qualidade e com conforto, como: ônibus com piso rebaixado, adaptados para atender a pessoas com dificuldades de locomoção, que sejam movidos com combustível alternativo à base de gás, energia elétrica ou biodiesel, micro-ônibus, veículo leve sobre trilhos – VLT, metrô, trem, dentre outros.
Evidentemente, há que se trabalhar a cabeça de todos os brasileiros e investir adequadamente na educação e mudança de valores de nossa população, nos convencendo que o coletivo deve estar acima dos nossos interesses pessoais. Só assim todos seriam igualmente beneficiados.
É importante demonstrar que o investimento nas melhorias das condições de circulação de pedestres, bicicletas e do transporte público eliminaria muitos dos males provocados pelos transportes individuais e evitaria que a sociedade, por exemplo, “gastasse” R$ 800 milhões na construção de um estacionamento para abrigar mais carros. Independentemente dos recursos serem públicos ou privados, este gasto em nada contribuirá para melhorar as condições de vida de quem vive e se desloca por Brasília.
Por outro lado, a adoção de uma série de medidas alternativas e complementares podem ser discutidas na Esplanada dos Ministérios tais como:
– A adoção de turnos alternados de trabalho e reflexão sobre o trabalho por meta/objetivo/tarefa/etc. que pode ser feito à distância;
– Existência de ônibus que atenda a cada um dos ministérios e outros órgãos e que faça percursos e conexões previamente planejados, visando a atender a clientela em foco;
– Rodízio de carros considerando o número da placa ;
– Incentivo a formas de transporte compartilhado.
Esperamos que as questões aqui levantadas sejam objeto de reflexão e análise por parte das pessoas interessadas nesta temática.
Rosa Maria Borges Manzan é Socióloga e voluntária da Rodas da Paz